terça-feira, 16 de junho de 2015

Presidente do COFECON comenta relações econômicas entre Brasil e China




O presidente do Conselho Federal de Economia (COFECON), Paulo Dantas da Costa, concedeu entrevista ao programa Agenda Econômica, da TV Senado, sobre as relações econômicas entre Brasil e China. O programa foi ao ar no dia 11 de junho e está disponível no site da emissora.

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Primeiro bloco do programa Agenda Econômica
Beto Almeida (jornalista): Alô, amigos e amigas, este é o programa Agenda Econômica que hoje está destinado a examinar as relações econômicas entre Brasil e China à luz do recente acordo firmado com a visita do premiê chinês ao Brasil.

Repórter: O Brasil acaba de assinar com a China um plano de cooperação no valor de US$ 53 bilhões de dólares, o equivalente a mais de R$ 150 bilhões. Abrange acordos em 35 áreas, como infraestrutura e agropecuária. No setor de transporte, os países farão estudo de viabilidade para construir uma ferrovia que ligue os oceanos Atlântico e Pacífico passando pelo Peru. O corredor reduziria consideravelmente o custo das exportações brasileiras para a Ásia. Ainda no setor ferroviário, estão em fase de ampliação as compras brasileiras de trens e metrôs chineses que já rodam no Rio de Janeiro. Além dos acordos firmados há negociações entre empresas brasileiras como a Vale e a Petrobrás, e instituições chinesas. Em 10 anos, o intercâmbio entre os dois países cresceu 500%. Saltou de 12 para 80 bilhões de dólares e a China se tornou o mais importante parceiro comercial do Brasil.

Beto Almeida: Para examinar esse tema, o nosso convidado ao programa Agenda Econômica hoje é o Paulo Dantas da Costa, presidente do Conselho Federal de Economia, a quem dou as boas-vindas. Obrigado por ter aceito o nosso convite. Paulo, é um acordo gigantesco. 53 bilhões em um momento em que há dificuldades enormes, inclusive financeiras, é um acordo que primeiro merece uma análise sob esse ponto de vista: a oportunidade histórica desse salto nas relações entre Brasil e China. Qual a sua avaliação?

Paulo Dantas da Costa: A minha avaliação é positiva. Em primeiro lugar, por conta dos projetos que foram contemplados nesse conjunto de atos que foram assinados recentemente. Mas, para ir além do detalhe mais específico, em relação a esses projetos, alguns deles dizem respeito a questões relacionadas com a Petrobrás, outros com a Vale, outros com a companhia telefônica Vivo, outro com a companhia de transporte Azul e tantos outros mais, inclusive de financiamento da ferrovia transoceânica. Mas eu quero destacar também aspectos que estão acima desses detalhes.

Beto Almeida: Quais seriam eles?

Paulo Dantas da Costa: Os chefes dos dois Estados, Brasil e China, destacaram determinados pontos que estão até acima desse detalhamento, como por exemplo as iniciativas dos dois Estados no sentido de erradicar a pobreza no mundo. Esse é um aspecto da maior importância. Outro ponto diz respeito a uma nova governança internacional e que inclui uma reafirmação ou redimensionamento da ONU, e também as reformulações que os Estados estariam empenhados em reformas de organismos financeiros internacionais à exemplo do Banco Mundial e FMI. Então, além do detalhamento dos projetos que serão contemplados, eu destaco também esses detalhes que estão acima dos projetos e que são, no meu modo de ver, de suma importância.

Beto Almeida: Agora, há quem analise que esses acordos, no porte em que eles foram formatados, representam também um novo desenho geopolítico internacional dada a proximidade do Brasil, integrando os Brics, mas, sobretudo, porque a China está realizando acordos como esse não apenas com o Brasil, mas com vários outros países da América Latina. Como o senhor vê isso?

Paulo Dantas da Costa: A China, a partir de uns 25 anos atrás, passou a desenhar uma própria reformulação no que diz respeito ao seu papel internacional, especialmente no campo comercial. A partir de então, ela vem progredindo. Nós, economistas, a bem da verdade, estamos acostumados a estudar determinadas economias. Estudar economia brasileira e o mercado de 200 milhões de habitantes é uma coisa. Estudar o mercado americano, com seus 300 e pouco milhões também é uma coisa. Estudar o mercado alemão, com 80 milhões de habitantes, é uma coisa. Agora, você estudar um mercado interno que atinge 1,3 bilhão de habitantes é outra coisa completamente diferente. E a China começou a aparecer no cenário econômico internacional como produtora de bens finais e a argumentação que nós tínhamos para identificar a capacidade de competição chinesa, nós sempre destacávamos a sub-remuneração do trabalho, ou seja, os baixos salários que eram praticados na China. Mas hoje não é só isso, a gente tem que incorporar um novo elemento que decorre dos ganhos de escala. Então enquanto você produz 10 mil unidades de um produto qualquer, uma comunidade chinesa produz 10 milhões. Isso gera uma série de condições que são diferenciadas. Alguns colegas economistas passaram a chamar a participação chinesa na economia internacional como “o fator China”. O fato é que a economia chinesa é a segunda do mundo. A China detém US$ 3,8 trilhões de reservas internacionais, o que é assombroso porque representa dez vezes mais do que as nossas reservas com um detalhe: a China acumulou tudo isso aí em função de ganhos de comércio exterior, o que significa dizer que os comprometimentos dela com o resto do mundo proporcionalmente são muito menores do que os comprometimentos que nós temos com as nossas reservas na base de US$ 370 bilhões.

Beto Almeida: O que o senhor diria em relação ao argumento de alguns especialistas sobre características complementares entre a economia chinesa e a brasileira. Por exemplo, eles precisam de minério, o que tem no Brasil e não há lá. Eles precisam de petróleo, que há muito no Brasil, e há, aliás, um acordo na área petroleira, e lá não tem tanto petróleo. Precisam de produtos agropecuários, aliás, o Brasil já exporta em grande parte para a China. Quer dizer, essa complementação oferece uma oportunidade histórica nova para nós?

Paulo Dantas da Costa: Sim, porque entre as intenções que os chefes de Estado pactuaram estaria a de retirar o Brasil do nível de exportação de produtos primários. Aí vai uma diferença do ponto de vista econômico bem significativa. Enquanto nossas exportações para a China são marcadas por produtos primários, como o grão de soja, minério de ferro e carne, o que, para nós economistas, deixa um pouco a desejar em função da baixa agregação de valor. É preciso esclarecer o que é agregação de valor: significa dizer que, na medida que você exporta grão de soja, por exemplo, você exporta por um valor X. Se fosse exportado sob a forma de óleo, ele teria o valor X mais alguma coisa porque, encima desse valor agregado, estaria a parte da indústria, o que geraria mais renda para nós. Então, eles assinaram, e eu vejo com bons olhos, a intenção de possibilitar que o Brasil possa agregar mais valor aos produtos que eles levam. E o que nós importamos da China? Nós somos superavitários, mas de lá vêm principalmente máquinas elétricas, mecânicas,...

Beto Almeida: E agora trens e metrôs que já rodam no Rio de Janeiro.

Paulo Dantas da Costa: Você veja que são produtos acabados. Para a China não existe, até por razões óbvias, ter na pauta de exportação algum tipo de alimento.     

Beto Almeida: Houve um elemento histórico que ficou presente nos discursos e os analistas também destacam, que é o seguinte: há 60 anos atrás, a China era um país subdesenvolvido. Hoje a China, e isso se inicia com a revolução de Mao Tsé Tung, já lança naves ao espaço sideral e ganhou, nos últimos dez anos, cerca de 80% das concorrências internacionais na área de ferrovias, um sistema ferroviário muito avançado que está sendo objeto de compras brasileiras. Essa evolução chinesa, esse salto chinês, também não seria um exemplo para o Brasil?

Paulo Dantas da Costa: Sim, não tenha a menor dúvida. Mas a gente sempre precisa recorrer àquela raiz: o país tem a sua determinada dimensão e tem o seu mercado consumidor, com mão-de-obra disponível para produzir o que julgar conveniente. Então a China passou a ter um exemplo de industrialização nesse processo que transcorreu nos últimos 25 anos. A China vem aperfeiçoando a sua indústria no sentido de produzir cada dia mais produtos mais elaborados. Isso é uma coisa que você não faz por querer, é preciso que exista uma série de circunstâncias que lhe possibilite isso e a gente cai um pouco nas agruras do nosso setor industrial que não tem tido possibilidades de competição, mais isso envolve uma série de fatores, isso não é culpa do industrial, mas um conjunto de circunstâncias que possibilitaram isso, inclusive o atraso tecnológico que nós temos de uma forma bem marcada no Brasil. Mas acho que isso é um caso à parte do que diz respeito aos acordos que foram feitos recentemente entre Brasil e China.

Beto Almeida: Nós estamos conversando com Paulo Dantas da Costa, presidente do Conselho Federal de Economia. No próximo bloco o Agenda Econômica vai abordar a questão em que medida esses acordos podem possibilitar também que não apenas o Brasil compre materiais manufaturados, preocupação já exposta pelo nosso convidado, mas que possa significar um avanço produtivo no caso brasileiro. Nós voltamos daqui a pouquinho com o Agenda Econômica. Continue com a gente.                                    

(*) Assessora de Imprensa do Cofecon
(61) 3208-1803/ 3208-1806

Escrito por Natália Kenupp


Fonte: COFECON

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